Como está o mercado de moda hoje? Esta é uma pergunta bastante complexa, mas não para Heloísa Aline, uma das papisas do mercado de moda mineiro. Há mais de 30 anos acompanhando as mudanças no mercado de moda mineiro e do muito, Heloísa já passou por muitas áreas: jornalismo de moda, consultoria, assessoria de imprensa e área acadêmica. Atualmente ela leciona em cursos superiores e responde por uma das disciplinas chave do programa MBA em Direção Criativa de Moda lecionando segmentação de mercado, além de tocar a Salamandra Comunicação e Marketing. Nesta entrevista Heloísa faz um balanço do mundo da moda, da tecnologia e novos nichos de mercado:
Como foi sua trajetória profissional até o momento presente?
É difícil resumir uma trajetória de 30 anos de moda. Posso dizer que acompanhei todos os movimentos do setor em Minas Gerais e no Brasil. Entrei para o Estado de Minas no final de 1979 para cobrir cultura, o que foi muito bom para mim porque foi um momento vibrante do cinema (Embrafilme), teatro, artes plásticas, literatura etc em BH/Brasil.
Daí comecei a colaborar com o caderno Feminino a convite da Anna Marina, minha ex-chefe, que sempre me deu muito apoio - depois me tornei editora adjunta do mesmo. Lembro-me que a primeira matéria que fiz sobre moda foi sobre a feira Minas Mostra Mulher, que, por sua vez, fazia sua primeira edição no hotel Brasilton, em Contagem. O Grupo Mineiro de Moda tinha sido criado e estava em ascensão.
Cobri todas as semanas de moda brasileiras, incluindo a Semana Leslie de Moda, promoção de Eloysa Simão, que realmente foi a precursora desta história de desfiles no Brasil. Lembro-me também do Ronaldo Fraga, estudante de estilismo na UFMG, sempre na redação do Caderno Feminino já despontando pelas suas boas ideias. Martielo Toledo, Jotta Sybbalena, Victor Dzenk, Eduardo Suppes, toda essa geração 1990 contou com meu incentivo. Descobri e apoiei muito estilista iniciante, como Luiz Cláudio, da Apartamento 03, um grande talento. Enfim, não sei se é bom ou ruim, mas tenho muito orgulho de ser uma testemunha ocular da moda mineira.
Depois de 30 anos no EM, resolvi seguir novos caminhos, que são o acadêmico e a abertura da Salamandra Comunicação e Marketing, em que desenvolvo projetos diversos, entre eles assessoria de comunicação.
Qual a sua opinião sobre o momento atual do jornalismo de moda, sobre a explosão dos blogs de moda e deles terem se tornado uma nova mídia?
Sempre tive uma cabeça contemporânea, pronta para procurar entender - e até admirar - as novidades. Afinal, ensino para meus alunos que o sistema da moda é constituido pelas novidades sazonais e pelo efêmero.
Gosto muito das novas proposta de moda, estive presente nesses laboratórios de estilistas, como o Phytoervas Fashion, Amni Hot Spot, Casa dos Criadores - em que despontam novos talentos. O jornalismo de moda precisa se renovar - todas as publicações seguem as mesmas fórmulas, o que é bem cansativo. Mas já caminhou um bom pedaço.
Sobre os blogs acho que é uma tendência que veio para ficar. E é muito boa, porque comprova a existência de uma sociedade democrática, em que cada um expressa a sua opinião democraticamente. Sobreviverão os melhores, os que apresentam conteúdo e criatividade. Ou os que souberem vender melhor o seu peixe mercadologicamente falando.
Até onde a tendência é significativa para a moda?
Por mais que se fale que não existem mais tendências, que agora a praia são os climas ou as atmosferas pequisados pelos bureaus especializados, percebe-se que pouca gente foge delas, apesar de estarem muitíssimo diversficadas. Quem foge? Alexandre Herchcovitch, Ronaldo Fraga, Samuel Cirnansky...
Na sua opinião qual é o futuro para a mídia impressa na era digital?
A dobradinha impresso/digital, que já existe, é um caminho. Temo particularmente pelos jornais, afinal sou uma cria do impresso. Mas as novas gerações não leem jornais, esta é a verdade. A tiragem desses veículos é, cada vez mais, menor. Então, o caminho será o digital. O Jornal do Brasil, um dos mais importantes do país, já está funcionando assim, comercializando conteúdo digital. As revistas terão uma sobrevida, acredito.
Quem você aponta como os grandes nomes da moda (designer) e do jornalismo de moda brasileiro atualmente?
Para mim, Alexandre Herchcovitch sempre foi um criador na essência da palavra, gostem ou não gostem do que ele faz. E tem também o Pedro Lourenço, que promete muito. Ronaldo Fraga se destaca por colocar em voga aspectos culturais importantes - cultura, ecologia, arte em geral.
Quanto ao jornalismo de moda, há muita gente boa, gente que vai chegando. Mas a verdade é que quem está na mídia sobressai mais - caso da Lilian Pacce, que tem um programa de moda na GNT, e é uma moça muito preparada. Gosto também da Érika Palomino...ela também é preparada, entende do riscado.
Como você vê a cobertura feita por jornais e revistas nas semanas de moda aqui no Brasil?
Acho que ela precisa se reinventar. É tudo muito igual e muito rápido, não existe crítica ou avaliação, apenas uma narrativa do que aconteceu na passarela, com raras exceções. Os sites e blogs, que são os veículos da hora, precisam apresentar mais conteúdo. Acho ridículo a blogueira que coloca uma ou duas fotos e, abaixo, o comentário: "Adorei". Adorou por que? Então fica tudo muito raso, muito superficial, muito brincadeirinha de quem gosta de moda e se acha expert. Gostar de moda, toda mulher gosta. Trabalhar com moda é algo muito mais sério.
Com toda a sua bagagem, quais sinais você está captando?
Muita marca, muito estilista, muita roupa, muito sapato, muitos acessórios. A cada hora pipoca uma nova marca, impossível estar informada sobre tudo. Acho que o setor está beirando à exaustão. Os anos 2000 são de revival - uma hora são os anos 1950, depois os 1970, depois os 1980, com novas roupagens, novas nomenclaturas. O mundo se acomodou. Cadê os movimentos jovens polêmicos que influenciaram a moda e vice-versa? Está tudo muito cansativo... Algo precisa acontecer rápido.
Que conselho você dá a alguém que acaba de sair da faculdade e quer se introduzir nesse mercado?
Sou jornalista profissional, com muito orgulho, mas uma autodidata no setor da moda. Só mais tarde fui fazer pósgradução na Fumec. Nos anos 1980, não havia livros, as revistas importantes demoravam mais de semana para chegar ao Brasil, não tinha GOOGLE. A gente tinha que buscar muito o conhecimento. Aprendi francês para ler as revistas francesas. Minha melhor arma sempre foi a curiosidade, a vontade de aprender. E aprendi muito com os meus entrevistados, todos os dias. Então, meu conselho seria este: estudo, pesquisa, aprimoramento, conteúdo.
Entrevista publicada originalmente no site http://www.espacocool.com.br
Entrevista publicada originalmente no site http://www.espacocool.com.br