Parte 8 de 8
"É um admirável mundo velho!" Carol Garcia
Carol Garcia |
A cool Hunter, jornalista e pesquisadora Carol Garcia é um furação da comunicação e pesquisa do cool que vem fazendo um extraordinário trabalho focado na busca de tendências e intercâmbio entre países da América Latina. Recentemente lançou o livro Imagens errantes: ambiguidades, resistência e cultura de moda em reúne histórias simultaneamente profundas e divertidas, vivenciadas ao longo de sua carreira como coolhunter internacional.
Pioneira na área acadêmica de cool Hunter no Brasil juntamente com Dario Caldas, autora de livros e diversos artigos em periódicos especializados, Carol e doutora e mestre em comunicação e semiótica. Coordenadora da pós-graduação de Criação de Imagem e Styling de Moda do Senac São Paulo, e docente universitária em várias instituições brasileiras e estrangeiras. Diretora científica da Modus Marketing e Semiótica. Atua como coolhunter e consultora para negócios da moda países como Índia, México, China, Japão, França, Inglaterra, Itália, República Tcheca, Tailândia, Nepal, Chile, Uruguai, Colômbia, Estados Unidos, entre outros.
Atualmente é uma das organizadoras do Senac Moda Informação em SP, fórum de tendências que orienta grande parte da indústria produtiva de moda no Brasil e ainda ministra workshops pelo mundo sobre a prática de cool Hunter.
Segundo divulgado no seu escritório virtual, a empresa Modus Marketing e Semiótica mixa métodos qualitativos e quantitativo de marketing com análises semióticas de forma a melhor reproduzir, compreender e interferir na realidade dos fenômenos de consumo. A partir daí é traçado um diagnóstico e feito todos os relatórios de forma customizadas para o cliente. O grande diferencial é que a empresa que a Carol Garcia é sócia e diretora científica, não só pesquisa, mas também ajuda a programar as mudanças de trends que pesquisou.
Recentemente, a cool Hunter concedeu uma interessante entrevista a coluna 3x4 do jornal Pioneiro no Rio Grande do Sul (julho de 2011) que mostra como pensa e atua no mercado. Em seguida acompanhe a publicação da entrevista:
Quem vê tanta imagem? Qual a potência da imagem hoje?
Carol Garcia: É a imagem que nos vê, ela que nos captura. Quando você tem um caleidoscópio de imagens, acaba em um mosaico movediço, se afunda nele, não o vê. Ficamos cegos diante de tantas imagens. Elas capturam nossas preferências e desejos, nos tornando imagem também. Quando a gente se coloca a serviço de uma marca, vira imagem dela.
O que o mundo da imagem oferece para atenuar a vida não boa?
Carol: Oferece a possibilidade de nos projetarmos e evoluirmos em um universo paralelo, de nos projetarmos numa publicidade, dentro de uma realização possibilitada por um ambiente de marca, de entrar numa loja e ser tratado como rei, esquecendo o mundo lá fora. Eu esqueço o trânsito, o ônibus, a fila.
Na cultura da massificação, onde fica a ética?
Carol: Toda estética tem uma ética, mesmo quando ela não é positiva. Não estamos falando de bem e mal, pois eles são pontos de vista. É cada vez mais interessante, por exemplo, falar de roupa sem mostrar uma peça de roupa.
O que legitima uma cultura?
Carol: É a capacidade dela de se reconstruir e mobilizar os mesmos elementos em outras combinações. É o que o Claude Levi-Strauss chama de bricolagem, a recombinação de elementos. É o que o marketing faz, tudo ao mesmo tempo agora o tempo todo. É um jeito de olhar para velhas coisas e reapresentá-las numa nova embalagem, fazendo acreditar que aquilo é de verdade. É o que a Igreja Católica sempre fez.
E o conceito de colonização nesse contexto?
Carol: Quem coloniza quem? Quando a Bethy Lagardere, que é uma socialite brasileira que vive na França, compra um produto do Emanuel Ungaro ou do Thierry Mugler, que são alta costura francesa, mas exige peças em verde amarelo, pois ela só usa roupas com as cores do Brasil, quem é dono de quem? Essa moeda circula. Por isso falo que as imagens são errantes. Elas não acharam seu lugar, é um efeito bumerangue.
Por isso tudo é volátil na contemporaneidade?
Carol: O (Zygmunt) Bauman, né?! Não trabalho com ele, uso basicamente autores latino-americanos e asiáticos. Pensei que, se vou falar de uma terra onde vivo e não conheço, preciso me aproximar dela. Nós não conhecemos a América Latina, rimos de nossos vizinhos, mas eles estão muito bem situados em suas culturas e potencialidades. Somos o único país latino-americano que não fala espanhol. O Brasil tem um território grande, se relaciona com suas regiões, mas muito pouco com as nações vizinhas. Aqui no Mercosul, menos. Qual a relação que temos com a Colômbia, o Peru, o Equador, a Bolívia? Zero. No entanto, a comunidade boliviana é responsável pela indústria do vestuário em São Paulo. Eles fazem a alfaiataria do Brás e do Bom Retiro, que veste 90% do país. E nós não vemos essa gente. Nos fins de semana, no Pari, tem uma feira onde só se come comida boliviana. E, ao mesmo tempo, nesse mesmo bairro, existem mulheres usando burca, pois ali também se concentra 90% da população muçulmana do país. Então, temos as bolivianas falando espanhol, com suas vizinhas de origem árabe, usando um traje de uma religião que não é a predominante no país. Isso é muito doido!
Assim emerge o conceito da iconofagia?
Carol: A gente se alimenta das imagens dos outros. A Frida Khalo fazia isso de forma genial: ela se vestia de índia para tirar fotografia e virar camiseta. Ela sabia que isso ia fazer dela um ícone do México. Era tudo milimetricamente calculado para ser percebido. Ela seria parte dos invisíveis, era minoria sob todos os aspectos. Ela resolveu que iria ser vista. E, ao mesmo tempo, ela é uma imagem tão vista, tão batida, que já não impacta mais. O superexposto também perde a visibilidade.
Como se apresenta o novo hoje?
Carol: Numa nova embalagem. E, sobretudo, com deslocamentos. Se eu pegar os trajes típicos dos gaúchos ou das rainhas da Festa da Uva e levar pro Acre, lá isso é novo. Então eu faria uma coleção de surfwear, com estamparia de bordado ítalo-brasileiro para vender no Acre, que é o maior consumidor desse tipo de roupa, embora esteja a 3 mil quilômetros da praia. Por que? Porque é quente e a novela da Globo mostra o mar. As sacoleiras africanas que vão a Fortaleza fazer compras carregam revistas de celebridades da novela que está no ar em Vale a Pena Ver de Novo, que é exibido lá pela Globosat. Elas querem o produto da novela antiga, que já não passa mais aqui, e compram o subproduto que não vendeu na temporada passada, no camelô da periferia. É um admirável mundo velho!
Para conhecer Mais:
Pocket entrevista com Carol:
Livros:
Site da Modus Marketing: http://www.modusmkt.com/