terça-feira, 27 de setembro de 2011

Observatório de Sinas – Teoria e Prática com Dario Caldas


Parte7 de 8

“Macrotendências são grandes movimentos ou correntes socioculturais, que influenciam as sociedades, a cultura, o consumo, por períodos de tempo mais longos.” Dario Caldas

Dario Caldas
     Um dos pioneiros na teoria da pesquisa de tendências de moda no Brasil, Dario Caldas é sociólogo e autor consagrado na área e diretor do Observatório de Sinas (São Paulo/SP), escritório de tendências socioculturais e de consumo, e também instituto de pesquisas que já contou com parceria do filósofo Gilles Lipovetsky, um dos pensadores mais respeitados quando se trada de contemporaneidade.
     Para Dario Caldas, somente mapeando as tendências é possível obter planejamento para se diferenciar da concorrência, que é cada vez mais competitiva. “Com métodos qualitativos, como é o nosso caso, buscamos sempre respostas a ‘porquês’, de modo a entender determinados padrões e valores inconscientes”, afirma o especialista.
   A seguir você acompanha trechos selecionados de entrevistas concedidas pelo trend Hunter a veículos nacionais entre 2009 e 2011:

Explique a metodologia utilizada pelo Observatório de Sinais.
Dario Caldas - A pesquisa de tendências tem sempre como ponto de partida o estudo dos comportamentos, mesmo que indiretamente. Como área de conhecimento, os estudos comportamentais se inserem tanto na psicologia, como na psicologia social, na sociologia e no marketing também (no marketing quando bem feito, pelo menos). Há diversos métodos para isso. No Observatório de Sinais usamos métodos da sociologia, da antropologia e da semiologia para estudar comportamentos sociais, e análise comportamental (com especialista da área) para os comportamentos individuais. Com métodos qualitativos, como é o nosso caso, buscamos sempre respostas a “porquês”, de modo a entender determinados padrões e valores inconscientes.

Como se faz a coleta de dados para o escritório de tendências?
Dario Caldas - A monitoração dos sinais, feita em múltiplas frentes – numa análise transversal (isto é, cruzando vários setores e esferas de atividades), local e global, por meio do indivíduo e dos grupos, da vida cotidiana, dos objetos, produtos e espaços, da tecnologia e da comunicação – gera, como instrumento metodológico, um mapa de tendências e sensibilidades emergentes, permanentemente revisto e atualizado. Esse mapeamento contempla, de um lado, as macrotendências - ou tendências de fundo - socioculturais; e de outro, os fenômenos de ciclo curto, como os modismos e as microtendências. Ambas são relevantes para o mercado, embora sejam as macrotendências as mais estratégicas do ponto de vista do planejamento, que não pode se fiar em fenômenos passageiros. Além disso, são feitas pesquisas de campo de diversos tipos, para atualizar o nosso banco de dados, a pedido de clientes. Em 2009, por exemplo, o Observatório de Sinais realizou entre fevereiro e março a pesquisa 'Consumo em Tempos de Crise', que resultou no 'Trends Pack Especial: Reduzindo Riscos | Mapa de Navegação Para a Crise', com oito novas tendências idealizadas especificamente para ajudar as empresas a atravessar o atual momento de turbulências e, ao mesmo tempo, projetar o futuro próximo de negócios, marcas, produtos e serviços.

Como se avalia a relevância das informações a serem levantadas?
Dario Caldas - Do ponto de vista do trabalho interno do próprio escritório, que é acompanhar, analisar, interpretar e produzir inteligência sobre as tendências, os sinais são avaliados de acordo com critérios qualitativos de pertinência - o que envolve o repertório e o conhecimento da equipe, os anos de “janela” e também um contraste entre os novos sinais e o quadro de tendências atual. Além disso, é realizada uma avalição sócio-semiológica, que procura mensurar a força relativa do vetor que está emitindo o sinal, anlisar o conteúdo do discurso que está sendo proposto e sua adequação ao público ao qual se dirige.

De que maneira se aplicam esses dados na prática e na rotina das empresas?
Dario Caldas - Um “observatório de sinais” só tem sentido se o trabalho for realizado em duas frentes: de um lado, o monitoramento permanente das tendências; de outro, a sua aplicação para o planejamento estratégico, o desenvolvimento de produtos, a gestão de processos de inovação, o posicionamento de marcas e da comunicação, a identificação de oportunidades de negócios. Do nosso ponto de vista, esse esquema falha quando se divide a prospecção, feita por uma equipe de inteligência, da aplicação, realizada por outra equipe, de estratégia. Na metodologia do Observatório de Sinais, tal cisão não existe nem tem razão de ser, pelo princípio de que o intelectual é o melhor parceiro da empresa na busca de numa nova síntese entre o que chamamos de “conceito” e resultados comerciais.

Pode ser aplicado no varejo? De que forma?
Dario Caldas - Sim, no varejo também. Já trabalhamos com hipermercados, com uma pequena rede de lojas e com shoppings de luxo.Apesar das diferenças de cada caso, todos procuravamo mesmo tipo de informação estratégica: uma compreensão ao mesmo tempo atual e prospectiva do consumo em geral e de seus consumidores em particular, a identificação de novas oportunidades de negócios e macrotendências para o varejo como um todo, para poder se planejar, se diferenciar e fazer frente a uma concorrência cada vez mais acirrada.

Você afirma que há certa confusão em torno do conceito de Macrotendência. O ponto de partida seria a definição de conceitos e termos. Quais são eles ? (macrotendência, tendência em moda, tendência em comportamento, grandes temas etc.)
Dario Caldas - Sim, é preciso diferenciar os termos, atualmente não se dá muita importância às palavras, o que gera confusão. Macrotendências são grandes movimentos ou correntes socioculturais, que influenciam as sociedades, a cultura, o consumo, por períodos de tempo mais longos. São também chamadas de tendências de fundo, em sociologia. Já os modismos, as tendências de moda, o boom, etc. são tendências de ciclo curto. Este último tipo de tendência também é importante para o mercado, mas as macrotendências são mais estratégicas, no sentido de permitirem a identificação de territórios de posicionamento e de novas oportunidades (para o desenvolvimento de novos produtos, por exemplo, um processo que geralmente demanda um tempo mais longo de maturação, não dá pra pensar em termos de modismos – no caso do fast fashion isso funciona muito bem, mas se pensarmos em termos de automóveis, objetos, espaços, serviços…a história é outra).

Se não é possível entender uma macrotendência pelo nível de desejos das pessoas, qual o índice ou sinais que indicam uma macrotendência ?
Dario Caldas - Insisto na definição, macrotendências são movimentos socioculturais, envolvendo uma série de variáveis na sua identificação. Só para exemplificar, pensando na feminização do consumo como uma macrotendência, é claro que ela não dependeu só do desejo das mulheres (ou de homens), mas da própria evolução das condições sociais e culturais, historicamente definidas ao longo do século XX, criando um quadro totalmente novo para a posição da mulher. É claro que isso não é novo, é uma história que já está aí. Mas o que importa, muitas vezes, é acompanhar as mudanças de coisas dadas – para o mesmo exemplo, como está evoluindo a identidade feminina, atualmente? e relação homem-mulher ? há mudanças sensíveis? em que territórios? etc. etc. Para realizar essa análise, será preciso buscar sinais em dados, pesquisas, monitoramento de mídia, evolução do imaginário etc. Os desejos das pessoas, e a forma como eles se expressam, são, sem dúvida, um sinal a mais.

Ao contrário do que acreditam alguns consultores, que todas as tendências vem da cultura jovem, existem macrotendências cruciais. Fale um pouco sobre o perfil dos “novos velhos” e qual o reflexo dessa geração para o mercado ?
Dario Caldas - Realmente, não dá para reduzir o mundo ao universo jovem, embora este ainda seja estratégico, principalmente no que se refere a modismos e adoção precoce de inovações. O envelhecimento acelerado da população é um desses fenômenos que fazem relativizar o peso dos jovens. Na verdade, a definição das idades todas e seu conteúdo é que estão sendo redefinidos, ou seja , isto não acontece só com os “novos velhos”, esse grupo que está longe de se comportar como aquela antiga “terceira idade”, pronta para se aposentar comportadamente…Eles são cada vez mais ativos (já que a evolução constante dos medicamentos e tratamentos de saúde tem permitido isso, além de prolongar a vida saudável em anos) e com poder de compra nada desprezível – enfim, uma grande oportunidade para novos negócios, produtos e serviços (que só tende, demograficamente, a crescer) e à qual o mercado brasileiro ainda não está preparado para responder.

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Livro da editora Senac Rio